A discussão em torno dos direitos trabalhistas por parte dos motoristas de aplicativo tem seu próprio enredo no cenário brasileiro. De um lado, temos o Tribunal Superior do Trabalho (TST), que em dezembro de 2022, reconheceu o vínculo de emprego de uma motorista do Rio de Janeiro (RJ), e, do outro, uma preocupação de que a Uber possa parar de operar no Brasil caso decisões assim tenham efeito vinculante.
Para o advogado Murilo Chaves, especialista em Direito Trabalhista e sócio da Ferreira & Chaves Advogados, não se deve cogitar uma subordinação entre trabalhador e empresa de prestação de serviços de transporte individual, porque não há vínculo de emprego entre eles, uma vez que o trabalho desempenhado pelas plataformas digitais não cumpre os requisitos dos artigos 2º e 3º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
“Os aplicativos de viagem surgiram com a Gig Economy, modelo de economia que se estabelece sob demanda. Esse trabalho não apresenta vínculo de emprego e, portanto, não existe regulamentação específica para essa forma de prestação de serviços”, explica Chaves.
O especialista afirma que a grande maioria das decisões judiciais trabalhistas na tentativa de reconhecer vínculo de emprego com a empresa dona do aplicativo são em desfavor do motorista, justamente por ausência de subordinação, que é um dos vínculos mais importantes. “O entendimento da maioria dos julgadores é de que o motorista dessas plataformas tem a liberdade na condução do trabalho e dos seus horários e usam a plataforma apenas para prestar serviços”, ressalta.
De acordo com o advogado, mesmo quando uma decisão é favorável ao motorista do aplicativo, ela costuma ser cassada pelo Tribunal justamente porque não há previsão legal. “Não há lei que regulamente a prestação de serviços de transporte individual e nenhuma decisão judicial transitada em julgado, ou definitiva. A Uber ou a empresa detentora do serviço tentará negociar ou até mesmo parar de operar no Brasil caso haja o reconhecimento de vínculo de emprego, pois a forma de negócio não será mais lucrativa”, observa.
Autonomia é primordial
Para o advogado Murilo Chaves não existe vínculo empregatício entre motorista de aplicativo e a empresa detentora da prestação de serviço por se tratar de uma modalidade de serviços da nova economia sob demanda. No entanto, é a favor da criação de uma legislação que proteja o trabalhador de forma a facilitar o seu acesso à previdência.
“Talvez uma contrapartida da plataforma que ele representa para o pagamento de previdência, de um seguro de acidentes pessoais ou algo nesse sentido para uma maior proteção, sem deixar de lado a autonomia, que entendo ser primordial para essa classificação de trabalho”, defende Chaves.
Murilo Chaves ressalta que no emprego normal o trabalhador não escolhe quando deve trabalhar ou fazer suas pausas, nem tampouco escolhe a rota que vai fazer. O advogado explica que o trabalho ordinário demanda subordinação e determinações do empregador. “O horário de trabalho normal costuma ser pré-definido no contrato e o funcionário não tem autonomia para decidir se vai ou não cumprir sua obrigação sob pena até de ser demitido por justa causa”, comenta.
O advogado destaca que já na prestação de serviços como os da Uber, de transporte individual de passageiros, o motorista tem autonomia em relação ao horário e de certa forma sobre a remuneração, já que quando ele acessa a plataforma saberá quanto receberá pela corrida e aceita ou não executá-la. “É claro que nós podemos fazer um contraponto disso com a questão da necessidade, da crise econômica e que muita gente pode se submeter a esse tipo de trabalho por necessidade e não por vontade. Mas, de certa forma, ele continua tendo autonomia sobre a forma com que vai trabalhar”, esclarece o especialista.