Advogados estão usando da boa-fé de pessoas que adquiriram imóveis em loteamentos populares em cidades da Região Metropolitana de Goiânia (RMG), e em outros municípios do Estado, para propor ações na Justiça com a promessa de reduzir o valor das parcelas dos imóveis. Acreditando que vão se beneficiar das ações judiciais e ter um tempo de alívio no pagamento das prestações, os compradores estimulados por estes advogados ingressaram com dezenas de ações na justiça. Mas o que parecia uma solução milagrosa tornou-se um problema para todos os envolvidos: famílias em situação de despejo iminente, empreendedores prejudicados e saturação das varas cíveis com ações que não têm chance de prosperar.
Neste malabarismo, muitas vezes os advogados repetem as petições iniciais, esquecendo de alterar os dados de cada cliente, misturando dados e informações básicas para o andamento do processo. Como é grande o número de clientes captados, as ações não são devidamente acompanhadas, causando na maioria dos casos ou a extinção dos processos sem julgamento do mérito, ou os pedidos são indeferidos pelos juízes pela fragilidade das argumentações.
Em outras situações, os advogados ignoram as sentenças dos juízes, determinando o pagamento das prestações através de deposito judicial ou pelo boleto da empresa vendedora, orientando os clientes a suspender qualquer pagamento, o que agrava ainda mais as consequências da sua inadimplência.
A Ordem dos Advogados do Brasil em Goiás (OAB-GO) investiga os casos, assim como o Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO), que inclusive realizou uma operação de combate a loteamentos clandestinos e de conscientização da população sobre cuidados na compra de imóveis e possíveis consequências do envolvimento com irregularidades. Isso se refere tanto a parcelamentos sem amparo legal como à ação de advogados que atuam na captação ilegal de clientes com a falsa promessa de redução de financiamentos.
O presidente do Conselho Regional de Corretores de Imóveis de Goiás, (Creci-GO), Eduardo Coelho Seixo de Brito, reconhece a gravidade da situação. Ele alerta que a atuação de profissionais que fazem captação ilícita de clientes prometendo reduzir parcelas de financiamentos pode e tem trazido muitos prejuízos. “Têm acontecido casos de advogados que oferecem facilidades para enganar os clientes e ficar com o dinheiro deles, mas é preciso que as pessoas tenham mais cuidado ao contratar um profissional. É preciso saber referências sobre esse profissional e observar a jurisprudência das cortes superiores (as decisões que têm sido tomadas em casos semelhantes)”, ressalta Brito. “Os tribunais têm pacificado suas decisões e elas são favoráveis aos empreendimentos que estão com situação regular e que fizeram tudo dentro da lei”, acrescenta o presidente do Creci-GO. Existe um contrato com cláusulas pactuadas, que devem ser cumpridas pelas partes, as empresas vendedoras e os compradores dos imóveis.
Ele faz um alerta para outro prejuízo financeiro que os donos de imóveis financiados podem ter quando caem nesse tipo de golpe: o de pagar os chamados honorários sucumbenciais, isto é, pagar a remuneração do advogado da parte que vence a demanda judicial. “O juiz vai arbitrar os honorários de sucumbência”, adverte. Eduardo Brito orienta ainda que é importante, ao adquirir um imóvel, inicialmente fazê-lo com um corretor registrado no Creci, que é uma autarquia federal. Também é importante pedir certidões e todos os documentos pertinentes para se certificar de que está fazendo um negócio seguro.
O Presidente do Secovi Goiás -Sindicato dos Condomínios e Imobiliárias – Antônio Carlos Costa alerta os consumidores que é muito importante cumprir rigorosamente as cláusulas previstas no contrato de compra e venda dos imóveis e lembra que essa forma de financiamento de lote só existe no Brasil, é feita pelos empreendedores, e é muito saudável para as pessoas que querem adquirir um lote pagando parcelas mensais que encaixam no seu orçamento. “A compra de um imóvel é um bom negócio, é um investimento seguro que sempre valoriza. Os clientes devem denunciar os loteamentos irregulares e os advogados que fazem captação através de propaganda enganosa prometendo facilidades, iludindo a boa -fé das pessoas, mas no final acabam trazendo prejuízo para todos”, destaca Antônio Carlos.
Senador Canedo
A operação do Ministério Público foi realizada em Senador Canedo, município onde aconteceu um caso investigado pelo Tribunal de Ética e Disciplina (TED) da OAB, que prejudica mais de 60 famílias e a empresa que fez o empreendimento e parcelou os lotes. A situação ocorreu no Residencial Hebrom, onde um advogado prometeu entrar na Justiça para pedir a redução das parcelas do financiamento de lotes e imóveis, mas não teria seguido com o processo, o que acarretou diversos prejuízos para eles. Alguns moradores já receberam, inclusive, a ordem de despejo devido à dívida que contraíram diante à imobiliária.
O golpe funciona da seguinte forma: o advogado faz a captação ilícita dos clientes, com a promessa de reduzir o valor da parcela e ficar com o pagamento suspenso durante a tramitação do processo. Com isso, o dinheiro que seria destinado ao pagamento da prestação é direcionado para os honorários advocatícios. Como são dezenas de clientes captados os valores recebidos pelos advogados são elevados. Usando o benefício da Justiça gratuita, os advogados envolvidos ingressaram com dezenas de processos na Justiça, usando a mesma matriz de petição, alterando apenas os dados dos compradores. Ocorre que a maioria dessas ações não tem êxito, não tiveram prosseguimento e deixaram as vítimas em situação complicada.
A maioria dos casos aconteceu durante a pandemia. Agora, dois anos depois, as decisões estão vindo à tona. No caso do Residencial Hebrom, o advogado Douglas Magalhães, apontado como responsável pela captação e pelas ações judiciais, foi denunciado à OAB. Em nota, a assessoria da Ordem em Goiás informou que “o caso ainda está sob análise do Tribunal de Ética e Disciplina (TED)”.
Operação
Já o MP-GO realizou uma operação de combate a loteamentos clandestinos que vêm sendo comercializados na zona rural de Senador Canedo. Denominada de Lote Legal, a ação contou com a parceria da Associação de Desenvolvedores Urbanos do Estado de Goiás (ADU-GO); Agência de Meio Ambiente do município (Amma); Secretaria Municipal de Planejamento Urbano e Desenvolvimento Econômico (Seplan); Companhia de Saneamento de Senador Canedo (Sanesc); Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad); Delegacia Estadual do Meio Ambiente (Dema); e Polícia Militar de Goiás (PMGO).
De acordo com a promotora de Justiça Marta Moriya Loyola, titular da 2ª Promotoria de Justiça de Senador Canedo e coordenadora da ação, a operação tem duas frentes: uma de fiscalização, como a que aconteceu nesta quarta-feira, e outra de conscientização da sociedade civil, envolvendo também os cartórios de registros de imóveis. Segundo ela, são necessárias ações voltadas também aos consumidores.
Cuidados básicos
Para evitar ser engando e ser vítima de golpistas que prometem facilidades, a principal orientação do MP-GO e dos órgãos ligados ao setor imobiliário é procurar o Ministério Público imediatamente se achar que foi enganado.